quinta-feira, 26 de novembro de 2009

SÓ OS PONDERADOS HÃO DE VENCER!
De Ciro Pessoa e Grace Gianoukas
(quando ainda resistíamos e ousávamos viver a 4 mãos e umas ideologias convergentes)

Perdi tudo. Eis o ponto em que me encontro. Tudo o que? Dinheiro, família, carnaval, ideologia, integridade. Como é difícil descrever o que é tudo. É claro que não perdi. Nada. Padeci e tenho padecido. Tudo.
Ontem mesmo quando descia no elevador, furioso e mal humorado porque o porteiro barrara meu personal fucker em potencial, distanciei-me deste mundo ordinário e atroz e entreguei os pontos : ele cumpre ordens e eu a partir de agora compreendo a extensão inefável de seu bigode-poder.
Mas que merda! Com tantas naves espaciais rondando o nosso universinho , possibilidades infinitas, o que o impede de ponderar? Ponderar é o grande babado! Bom senso, isto pode mover o mundo. Porém, o bom senso tem produzido excelentes extensores de pênis, panquecas longilíneas, pick-ups inúteis e a Festa do Peão de Boiadeiro ( de Barretos). Porque um bom senso é sempre construído no óbvio.
Entenderam?
Mas voltando à mídia, quem são os vencedores?
Num país de pescadores de fissurelas, onde ninguém sabe o que são fissurelas, haveremos de convir que não atingimos o estado de famosos.
Já, Garibaldi, Juscelino, Salim Farah Maluf, Anchieta, Raposo Tavares, tantas celebridades (sem esquecer, é claro, o Grande Dr. Homem de Mello) sempre farão jus aos sonhos que povoam nossas conquistas astronáuticas.
Rondon, um exemplo.
Amauri Júnior, o homem do tempo. E Madonna, a rainha da mídia.Pessoal!
Por ora é isto! Voltaremos a nos ver!

( Jd Bonfiglioli-junho 2007)


"Carta-crônica" que recebi do meu grande amigo Ciro Pessoa

(Esta carta foi publicada em abril de 2007, na coluna¨"Carta para Ela" que o poeta e compositor Ciro Pessoa escrevia para a Revista Criativa )

Gracita, minha linda:

Ontem à noite, finalmente!, vi o filme “Vinícius” na televisão . Você se lembra o quanto você insistiu comigo para que eu o assistisse quando ele ainda estava em cartaz nas salas de cinema ? Agora que eu o ví, fico imaginando porque você queria tanto que eu o visse. Onde será que a sua mente, que me conhece tão assombrosamente de perto ( entre você e eu lá se vão mais de vinte anos de cumplicidade, arte, amor e amizade) , me viu na vida e na poesia de Vinícius de Moraes?

Pois bem, eu tenho cá minhas suspeitas.

O que mais me tocou no filme foi um dos (sempre primorosos) depoimentos de Chico Buarque. Precisamente aquele em que ele tenta imaginar como Vinícius estaria hoje caso ainda estivesse vivo. A certa altura ele vaticina “ eu não consigo imaginar um sujeito como o Vinícius vivendo nos dias de hoje. Primeiro porque não há mais espaço para a generosidade...”. É claro que esta profecia veio antecedida de uma série de revelações do próprio Chico sobre o comportamento absolutamente desapegado de Vinícius “ enfiava sua dinheirama no bolso e ia pagando tudo para todos...”. Um cara absolutamente coerente com sua vida de poeta cósmico. E o Chico tem razão : não existe nada mais fora de moda do que a generosidade. O generoso neste começo de século é o chamado otário.

Como eu gostei de saber que ele agia desta forma, Gracita! . Que misteriosa relação há entre o seu profundo desapego e sua elegante e libertária poesia endereçada a todos os seres humanos! E como me lembrei de você, a mulher sempre atenta ao que os outros estão precisando e a atriz, a grande atriz que tantas vezes me fez chorar de rir com seu generoso e genial humor! E que tantas vezes me fez simplesmente chorar com as histórias de sua vida real. (Longa vida à sua Terça Insana!)

No mais, a vida de Vinícius é, em si, uma grande poesia, sem dúvida. Todos sabemos o quanto ele era apaixonado pelo amor e pelas suas mulheres (foram inúmeras!). Mas o que mais me surpreendeu foi o quanto ele cuidava de suas amizades e o quanto elas eram importantes para ele. Aí pensei em nós dois de novo, Gracita. Você se lembra de que temos um pacto de envelhecermos juntos, morando, quem sabe, na mesma casa? De minha parte, o pacto está fechado, inviolável, consagrado.

Com a velhice, assim como Vinícius, poderemos dar excelentes estridentes risadas. É de Chico, de novo, a observação : “ sempre que me lembro de Vinícius, lembro-me dele dando risada...”. E mais : o quanto ele rejuvenesce em sua trajetória de diplomata a consagrado poeta da bossa-nova e depois do afro samba. Nisto também nos vejo, minha linda Gracita.

Quantos aos milhares de versos que pontuam o filme, um em especial me diz respeito : “Eu não quero ser feliz / eu quero viver” . Achei isto assombrosamente belo. Foi o Tom Jobim quem pescou esta pérola de sua obra. Eu também, sabia Gracita? Eu quero a vida com tudo o que ela tem a me oferecer : pura dor, céu azul, tempestade, super alegria, decepção, viagem a Honulú e musse de chocolate. Desconfio daqueles que buscam obcecadamente a felicidade e passam ao largo dos outros sentimentos.

Por fim, o filme me trouxe o valor do poeta e da poesia nestes tempos de Big Brothers e cilicones. Porque de fato a vida de um poeta é sempre inusitada, assim como a de um jardineiro, de uma borboleta ou de uma nuvem. Todas tão intensas. A sua vida, Gracita minha linda, está cheia de lances poéticos no melhor estilo Vinícius. Que você, com sensibilidade, maestria e muito talento, consegue transformar em brilhante humor.

Te adoro, minha linda amiga!

terça-feira, 17 de novembro de 2009

RECOMENDO

"Meu Amigo Claudia" foi eleito pelo público como o melhor documentário do LesGaiCineMad, o festival de cinema GLBT de Madrid,
Documentário sobre Cláudia Wonder será apresentado no Festival Mix Brasil
exibição do "Meu Amigo Claudia"
local: Cinesesc - R. Augusta, 2075
data e horário: 22/11/2009 - às 20:30





Não é um lançamento recente mas este CD de Iggy Pop é delicioso

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

São Paulo, luz.

Quando a gente vai vivendo e lutando em São Paulo por muito tempo, se vai, aos poucos, esquecendo que além destes milhares de prédios, antenas e painéis existem ainda muitas árvores, outros pássaros que não pombos e pessoas calmas e com tempo.
A gente “amadurece” aqui, o que os olhos vêem o coração não sente. Eu sei que ver é irreversível, mas às vezes a gente quer cegar a alma pra parar de ver o que não dá pra modificar: profundas injustiças na cidade das oportunidades.
Mas existe um lugar que nos faz entender São Paulo: o Parque da Luz, o coreto, a estação, seus camelôs, desempregados, mendigos, aposentados, prostitutas, cães, aquela música urbana, a José Paulino, os compradores, o restaurante Acrópole e a Pinacoteca.....Ah, a Pinacoteca, um oásis, onde finalmente podemos sem medo tirar as vendas da alma e deixá-la enxergar, porque lá é permitido se emocionar, o que os olhos vêem o coração está autorizado a sentir.
Um passeio pelo acervo da Pinacoteca nos ensina a ter um olhar circular sobre as obras. São tantos traços, formas, sensualidade, dor, humor, intimidade, dignidade, exatidão, amor, ódio, risco, ousadia. Tantas óticas pra traduzir o mundo.
Quando deixamos a Pinacoteca nossa alma não aceita mais nenhuma venda, ela está curiosa e então olhamos em volta e lá esta a luz: o parque, a estação com as prostitutas, as obras de arte,os velhinhos, trabalhadores, imigrantes, todos que correm e lutam e pulsam e sangram e sofrem e riem e cheiram e amam e descobrimos que São Paulo tem vísceras. E elas gritam em cada esquina pra que nós tiremos as vendas e pra que aprendamos a ser felizes dentro desse caos. Ter coragem de olhar nos olhos de qualquer um sem medo ou culpa, pra que possamos nos deixar atarantar e pra que voltemos a ter esperança, pra que voltemos a sonhar. É o sonho de cada um de nós que dá vida pra São Paulo..As prostitutas sonham. Sonham os camelôs, trombadinhas, donas de casa, travestis, executivos, policiais, dependentes químicos, crianças, artistas. Sonham e são sós... A arte nos devolve as chaves da caixinha onde os nossos sonham estão guardados. E numa cidade como São Paulo, que às vezes nos parece abandonada, onde às vezes nos sentimos completamente desamparados, a arte nos ensina a compaixão, essa ótica circular tão poderosa que transporta nosso olhar de dentro de nós até o outro. Luz pra todos nós.
Um beijo.
Grace Gianoukas

Sonho

Gente, que saco!!!!
O Rodrigo Santoro não larga do meu pé. Telefona, manda flor, fica chorando na porta da minha casa.
Dizer não, delicadamente, não adiantou.
Eu tive que dizer pra ele bem na cara:
- Rodrigo, desculpa a franqueza, mas não dá, não te quero nem pra uma rapidinha.

Vocês vão dizer: “Essa louca tá sonhando”
Estou mesmo.
“Sonhar não custa nada, não se paga pra sonhar”, cantou a Mocidade Independente de Padre Miguel.
Ainda bem. Já pensou? Era só o que faltava.

Uns sonham com a casa própria, outros com a Mega Sena.
Uns sonham encontrar um grande amor, outros com a separação, outros em dar só uma escapadinha.
Tem os que sonham com a fama e depois, de tão famosos, sonham com um minuto de privacidade.
Tem sonho recorrente, premonitório, erótico. Cada um sonha com o que bem entender. E eu gosto de sonhar que o Rodrigo Santoro é apaixonado por mim. Me deixem.

Sonhos inspiraram Dali, Fellini, Picasso, Einstein.
Sonhar sonhos impossíveis tem alavancado o homem para incríveis descobertas.
Chegamos ao espaço, deciframos o código genético, mapeamos o cérebro humano e.... Que medo! Abrimos as portas pra uma apavorante aliança entre ciência e publicidade: o neuromarketing.
Pensando bem, sonhar com o galã de cinema e não com o atendente do açougue do bairro, já é um efeito do marketing...
Será que nem sonhar livremente a gente está podendo?
Não, a gente não pode mesmo.

O sonho acabou há muito tempo. Não dá nem pra sonhar com o açougueiro do bairro. O açougue fechou. Quitandas e minimercados foram engolidos pelas grandes redes.
E o Canal Futura é um canal a cabo. Os milhões de semianalfabetos brasileiros agradecem.

Aquela casa no campo pra plantar os amigos, os discos, os livros e nada mais... Revelou-se um tédio.
Os carneiros e cabras pastaram tão solenes que foram tomando conta do jardim, foi uma detonação, não sobreviveu uma flor, uma muda de grama. Defecavam tudo, tinha que viver limpando, um mosqueiro...
As crianças logo tiveram que estudar na cidade. No campo só tem escola pública, todas péssimas. Aí vieram os trabalhos de grupo, os campeonatos e logo as festinhas da turma de amigos da cidade. Lá ia o pai pegar a estrada às 4 da manhã pra buscar os adolescentes na cidade, isso quando não ficava dormindo no carro, na esquina da festa.
Nem precisa dizer que o celular foi inevitável.
Os amigos já não apareciam como antes. As últimas visitas tinham sido repletas silêncios. Os assuntos não rendiam mais como antes:

- Você leu “O Cosmos de Humboldt”?
- Detesto ficção científica.
- Não é ficção. É sobre a viagem daquele cientista alemão, Alexander von Humboldt, à América no século XIX...
- Nem ouvi falar desse cara, ciências nunca foi meu forte. Ultimamente estou mais dedicado aos livros de economia mundial, globalização. Você sabe como a nossa fábrica cresceu. Estamos exportando até pra Dinamarca, os gringos adoram artesanato com sementes.
- Quem diria, né? Lembro de nós dois expondo no chão da feira hippie.
- Nem fala, não sei como eu conseguia viver daquele jeito.
- A gente era livre, sempre alguém aparecia com um baseado, as garotas adoravam o nosso trabalho “artístico”... Como a gente era feliz.
- Eu não era. Como alguém pode ser feliz naquela penúria, um desconforto... Tenho arrepios só de lembrar.
- ........
- Você tem acompanhado a CPI?
- Que CPI?
- ........

Depois de um longo silêncio:

- Cara, tenho que ir. Sabe como fica essa estrada nos domingos, quando o povo volta dos sítios. Vamos falando por e-mail.
- Legal...

Foram ficando tão solitários e isolados quanto os analfabetos digitais, categoria onde também estavam incluídos. Um dia instalaram TV a cabo, noutro banda larga pras crianças e pra eles, nos quatro computadores que adquiriram pra casa, pois agora passavam as noites navegando em sites pornô, cada um no seu PC, sempre tiveram um casamento aberto. Depois assinaram pay-per-view do reality show pra ver aquele pessoal trancado, isolado do mundo.
Que nem eles.
Fizeram a vontade dos filhos e agora moram num apartamento de 4 quartos, com área de lazer completa.
“Ainda somos os mesmos....” .
Só o sonho de valsa ainda é igual.... Porém hoje, oferece opções de novos sabores. Experimente.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Maturidade

Noutro dia, acordei tão cedo que nem me vi.

Escovei os dentes falando no telefone. Passei hidratante no rosto e penteei o cabelo no elevador.

Trabalhei, trabalhei.

Só fui encontrar comigo, na hora do almoço, no banheiro, através do espelho oxidado do restaurante a quilo.

- Nossa!!! Tô tão bonitinha hoje!

Pensei.

- Tô bonitinha mesmo!!! Assim ao natural, sem lápis, sem batom. Tô linda!

A conclusão me fez imediatamente feliz, em seguida simpática, logo após sedutora e, por fim muito segura, cheia de coragem pra paquerar caras interessantes que, como eu, também eram clientes do quilo. Saí do banheiro com a plena consciência do meu poder de seduzir qualquer homem que eu escolhesse.

Encaminhei-me pro buffet. Uma fome!

Percebi. Ser feliz dá fome. Estava avançando na feijoada quando me dei conta de que mulheres lindas e sedutoras jamais foram vistas comendo feijoada.

- Qual é? Quer quebrar o encanto?

Perguntei pra mim.

Desviei para as saladas, me servindo com parcimônia. Verdes e um microbife.

- Isso mesmo. Assim que se comporta o centro das atenções.

O rendimento foi total: paquera, sorrisos, troca de telefones que resultaram até em ligações, de fato. As conversas telefônicas foram seguidas por jantares, cinema, lingerie nova e orgasmos ocasionais. Temperos pra essa vida que não para: trabalho, trabalho, acordar atrasada, perder o ônibus, hora extra... Normal.

Hoje, quando caminhava pela rua apressada pra uma reunião, avistei, de relance através da vitrina, meu pai dentro de uma loja. A ficha foi caindo durante os meus próximos cinco passos.

- O que papai está fazendo aqui? Meu pai está morto!!!

Parei apavorada. Tinha que saber por que o espírito do meu pai estava ali, talvez quisesse me dizer alguma coisa. Caminhei de volta, cinco passos trêmulos e, cheia de coragem, levantei o rosto decidida a olhar de novo e encarar a situação, foi quando dei de cara comigo mesma refletida na vitrine.

- Nossa! Eu estou a cara do meu pai.

Pensei aliviada.

- Puxa, faz dois meses que eu não depilo o buço.

Horrorizada de vergonha.

- Estou um monstro. Tenho cara de homem.

Sempre fico constrangida quando vejo mães ao lado de filhas idênticas, pois penso que o cara que for paquerar a filha desistirá imediatamente após saber como ela vai ficar daqui a alguns anos.

- Estou envelhecendo. Fazer o quê?

A gente vai perdendo as curvas, colágeno...

- Mas será que eu não podia ter a sorte de envelhecer como uma mulher?

Tenho que envelhecer parecendo um senhor?

Tive vontade me atirar embaixo do primeiro carro, pra não ter que ver a coisa piorar, então senti um molhado quente entre as pernas.

- Claro, ridícula, é TPM. Pra quê eu faço tabelinha se nunca lembro de acompanhar?

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Me contraio

texto que escrevi numa dessas madrugadas)

São Paulo, inverno de 2009, 4:40

Pé gelando - pijama de vaquinha - pantufa de onça - alma arrebatada - olhos de harpia...
Como?
Olhos de harpia? Qual harpia, a ave de rapina mais poderosa do país ou a harpia da mitologia grega, a monstra com corpo de abutre e cara de mulher?
Caguei. Isso é irrelevante. Agora.
Tanto faz ter o olhar de uma ou de outra; ser eu uma, ou ser a outra.
Eu me sinto empalhada, petrificada. Agora.
Meus olhos estão muito abertos, estatelados. Olhos de águia empalhada, olhos de estátua, olhos de monstra grega.
Acho que nunca mais conseguirei fechar os meus olhos, mesmo que eu queira, mesmo que eu mande, eles não me obedecem mais.
Quando gero uma idéia logo surge um pensamento que começa a crescer dentro de mim. Alguns pensamentos, como os insights, são sufocantes, pois às vezes, são porradas tão fortes que acionam os airbags da alma que inflam em poucos segundos, depois se encaixam como qualquer outro pensamento e vão se moldando em conceitos e entendimentos. E, toda vez que isso acontece, a cada novo pensamento, meus olhos involuntariamente se abrem, como se fossem bucetas parindo minhas compreensões.
Tive um dia bem denso, daqueles sem extintor ou saída de emergência: vida real sem nenhum lubrificante. DÓI. E o pior é que é tudo verdade, a gente não acorda, não tem log-off, nem anestesia.
Procuro alguma coisa que me arrebate, algo que me traduza, algo que me emocione tanto, que seja capaz de me catapultar pra um outro estado de sabedoria.
Nada. Originalidade zero."Alguma angústia faz parte: o que é vivo, por ser vivo, se contrai", escreveu Santa Clarice Lispector, padroeira dos inadequados, que trafegava entre o mundo que vemos e o inconsciente pra traduzir e abrir portais de entendimento.
O que me resta no fim de um dia como este?
Entender. Ligar os pontinhos e formar a figura.
Fico filosofando sozinha...
Eu me contraio pra depois me expandir. Eu escrevo, avanço, marco terreno, edifico compaixão, me derramo em paz.
Finalmente meus olhos rebeldes voltam pra mim: “Tá bom por hoje? Vamos descansar?”, digo no escuro.
Meus olhos lacrimejam, sorriem e completamente entregues começam a fechar.

É relevante


O documentário Dzi Croquetes - filme de Tatiana Issa e Raphael Alvarez - sobre a trajetória do grupo carioca. Conhecer Dzi Croquetes é imprescindível.


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O livro Fábulas Farsas de Gil Veloso, publicado pela Ópera Prima, também é imprescindível.


Para Lenise Pinheiro e Nelson de Sá

(comentário postado no Blog Cacilda no dia 11/10/2009)

Oi, Lenise. Oi, Nelson.

Passo os meus meses e anos no palco e na empresa, vou do escritório de produção pro ateliê de criação. Às vezes consigo fugir por alguns minutos do Outlook, do Word, do Safari e vou passear pelo Cacilda. Quero aproveitar minha folga pra declarar o meu respeito e admiração pelo trabalho que vocês estão fazendo. Tuas fotos, Lenise, são emocionantes. Não sei que lente secreta ou abençoada é essa que tu usas, mas muitas vezes, dá pra ver a alma. O Nelson tem um ponto de vista panorâmico, respeito e bom senso, os comentários são embasados e incisivos, por isso, relevantes. Este é um momento muito especial na história do teatro brasileiro, é tempo fértil, tem centenas de peças em cartaz, do udigrudi ao clássico, tem novos dramaturgos e encenadores de todos os estilos, tem artistas arrebatadores e oportunistas tediosos, tem obras originais e produtos da indústria do entretenimento. O fato é que o Teatro está mais perto da vida e do bairro das pessoas de todas as classes. Tanto é, que tem muita gente registrando este momento na imprensa, na internet, dando opinião, esclarecendo, fazendo confusão, revelando os novos gênios, os fenômenos da ocasião e, muitas vezes, descartando o nível cultural, o mérito, a originalidade artística e o talento de grandes artistas do teatro brasileiro.
Mas o bom mesmo, é que registrando este momento, também tem gente que conhece a arte teatral por dentro e por fora, que se mantém interessado e entusiasta, gente como vocês dois que amam de verdade o Teatro e por isso vocês devem estar se virando em 8 pra poder assistir, comentar e divulgar tantos espetáculos, estejam eles num palco elisabetano ou no meio da calçada. O grande diferencial é que vocês torcem pelo teatro.
E neste tempo, há momentos confusos e desconcertantes, como quando nos deparamos com o Sérgio Malandro na capa da Revista Trip. A gente paralisa, nossa boca abre - não tem sinapse que consiga fazer esta associação de conceitos - paramos de entender e mergulhamos na certeza de que o mundo acabou.
Por isso, eu também torço muito por vocês, pra vocês conseguirem, sempre, manter está capacidade divina e generosa, de tentar estar em todos os lugares ao mesmo tempo.
Nelson e Lenise, vocês estão plugando mais spots, afinando os focos e iluminando melhor este palco, pra contar a mais confiável versão da cena 1980 até a cena 2040 da história da arte brasileira .
BRAVO!!! BEIJOS!!!! BOA SORTE!!!!

Grace Gianoukas

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

O Louco-a primeira carta do Tarot

Eu apostei alto.

Muito cedo na vida eu decidi que não faria plástica no nariz:

- Por que você não dá uma levantadinha na ponta do seu nariz?

- Não.

- É uma cirurgia tão simples e vai ficar tão bom.

- Não vou fazer plástica. Não quero mudar o meu nariz.

Foi uma decisão corajosa e transgressora, revelou o esboço da minha personalidade idealista, me fortaleceu. E depois, o meu nariz incomodava aos outros, eu mesma não tinha nenhum problema com ele e, sinceramente, não achava nada de tão esquisito ou inadequado no seu formato que justificasse a constante pressãozinha praticada pelos meus convivas, em prol de uma plástica para o meu nariz.

- Plástica? Pra quê? Não quero fazer uma plástica. Fazer, por quê?

- Porque vai ficar bom, mil vezes melhor.

- Mil vezes melhor quer dizer ficar bonita?

- Bonita você já é, a plástica vai te deixar “mais” bonita.

- Pra quê? Que inferno! Por que eu tenho que ficar mais bonita. Não entendo isso, que saco!

Não sei quanto tempo de fato, durou aquele bombardeio de “sugestões”. Pode ter ocorrido durante seis meses, um ano ou dois, mas pra mim parecia uma eternidade. Eu me sentia perseguida. Um dia mudei o foco e percebi que talvez não fosse só implicância dos mais velhos pra torturar a irmãzinha caçula, talvez fosse preocupação comigo. Oh, que amores! Tinham medo de que o meu nariz prejudicasse o meu futuro.

- Vocês acham que sem plástica eu corro o risco de me tornar uma encalhada? Não se preocupem, pois isso não vai acontecer. Saibam que o cara que vai me amar no futuro, melhor dizendo, saibam que o homem da minha vida terá outros valores, vai me desejar pelo que eu sou, pelo meu todo e irá, também, gostar do meu nariz. Se meu nariz afastar ou reduzir a possibilidade de ser amada por algum homem, vai ser ótimo! Perfeito! Eu vou ter certeza de que aquele homem, não é o homem da minha vida.

- !!!!!!!

- É exatamente por isso que eu não posso fazer essa plástica que vocês sonham que eu faça.

Dei um ponto final. Aceitaram meus argumentos e pararam de me azucrinar.

O que comecei a questionar, recentemente, foi a origem daquela minha certeza absoluta, repleta de justificativas procedentes e proféticas. Que fé era aquela minha, que me fazia acreditar que o “homem da minha vida” existia em algum lugar e que nós iríamos nos cruzar um dia? Embasada em que eu tomei a firme decisão de não fazer plástica no nariz, pois afinal de contas, na época, eu devia ter uns 11 anos.

Acho minha decisão foi embasada em obras como “O Patinho Feio”, “Dumbo”, “Branca de Neve”, “Jeannie é um Gênio”, “Banana Split”, etc...

Graças a educadores como os Irmãos Grimm, a dupla dinâmica, Walt Disney, Topo Gigio, Sidney Sheldon , Super Mouse e Garibaldo, entre outros, eu tinha a certeza de que no final haveria justiça, o bem venceria o mal e todos seriam felizes para sempre.

Lembro que depois de entenderam meus motivos, nunca mais tocaram no assunto. Quando a pressão externa acabou, eu ganhei espaço pra pensar em mim e não conseguia tirar da cabeça que meu nariz devia ser mesmo uma anomalia, caso contrário ninguém teria sugerido que eu fizesse uma plástica. Eu devia ser horrorosa e ainda não tinha percebido. Cada vez que me olhava no espelho dava conta de como eu era nariguda:

- Nariguda, talvez não, pois meu nariz não é tão grande, mas tem a ponta pra baixo, derretida... Eu pareço um avião concord.

Um dia a caminho da escola, quando atravessava a Praça Tamandaré, dei de cara com a anta que morava no mini zoológico e tive um insight :

- O nariz dela é igual ao meu.

Dali em diante, sempre que avistava a anta passeando ou nadando pelos lagos da praça eu percebia nosso parentesco. Criei um enorme carinho por ela.

Quando me apaixonei pelo Peter Frampton, pensei:

- Eu realmente tenho um nariz estranho, talvez eu deva, mesmo, fazer uma plástica...

Mas depois da decisão tomada eu não podia voltar atrás. E o meu orgulho? Até o Peter dizia “Oh, baby, I love your way”. Eu não podia dar o braço a torcer.

Algum tempo depois eu tinha um novo amor: Robert Plant. Eu lia Jorge Mautner, ouvia Rita Lee e Tutti-fruti, Led Zepellin, Novos Baianos, Janis Joplin, Frenéticas...Cry baby. Ziriguidum. Um belo dia resolvi mudar. Eu sei que eu sou bonita e gostosa. If the stores are all closed, with a word she can get what she came for.

- E daí, que meu nariz é esquisito? Grande merda. A sociedade vai me julgar em função do meu nariz? Se vai, pode vir que eu já estou preparada. Nada vai me atingir.

Ganhei a força de um exército. Fiquei enfrentativa. Entrava nos lugares com o nariz empinado, tão cheia de mim, que ninguém ousava me atacar.

Logo outros inadequados se aproximaram. Hoje pertenço a uma enorme turma de esquisitinhos. Nunca fomos perfeitos, o que com o passar dos anos se revelou uma grande dádiva.

Quem nasce, se torna ou aparenta ser perfeito, tem lugar garantido no “modus vivendi”. Um paraíso de conforto, por mais hipócrita que seja.

Já os imperfeitos, como não tem nada a perder, podem dar a cara pra bater, tem liberdade pra arriscar, pra errar, pra sonhar com o novo, pra fazer caminhos diferentes, pra tentar mais vezes, pra desbravar, pra descobrir e pra criar...

Sou bem feliz com o meu nariz.

Os Ingênuos no País das Maravilhas e a Liberdade

Os Ingênuos no País das Maravilhas

As possibilidades da internet são tantas e tão amplas que até mesmo o expert-vanguardista, detentor absoluto do conhecimento de base e de ponta e da linguagem, ban-ban-ban da tecnologia, o grande visionário por mais que enxergue longe, ainda nem viu um palmo diante do nariz, na realidade da web ele é como uma formiguinha de pia no meio do Maracanã.
Nós ainda iremos descobrir e inventar milhões de novos recursos, por enquanto estamos diante do infinito, sem bússola.
É a corrida do ouro, quem chegar primeiro ganha, foi dada a largada, cada um corre pra um lado. Não sabemos pra onde estamos caminhando, podemos achar ouro ou fezes..
É preciso tomar muito cuidado ao entrar neste País das Maravilhas, pois tem setas pra mil direções, apontando caminhos pra lugares novos que dizem ser super- hiper- legais... Mas tem um lugar que tá bombando. Se todo mundo tá indo pra lá, com certeza é o “melhor lugar”, e é pra lá que muita gente escolhe ir...
Alguém pode me explicar o que há de super hiper neste Twitter?
As pessoas que ficam seguindo o Luciano Hulk ou o Arnold Schwazenegger estão caminhando para o ouro ou para as fezes?
Nem precisa responder. Eu sei que na internet tem de tudo pra todos os gostos, há liberdade de escolha e de expressão.
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Liberdade

Nós somos pessoas informadas, atualizadas e independentes.
Temos nossas preferências e nossas opiniões.
Mas será que já paramos pra pensar o quanto a opinião dos outros pesa no nosso comportamento, nas nossas escolhas?
A roupa que estamos vestindo?
O modelo de celular que usamos. O provedor de internet?
O carro que estamos ralando pra pagar?
O voto que demos nas últimas eleições? E a nossa opinião sobre o auxílio paletó, vale alguma coisa?
E aquela música que a gente odeia, mas que não sai da nossa cabeça...Como é que entrou?

“Pode ser verdade que agimos como escolhemos, mas podemos escolher? Ou será que nossas escolhas são determinadas por motivos que não sabemos explicar?
- se odiamos a programação da TV, por que não vamos ler um livro?
- se reclamamos do preço de um supermercado, porque continuamos comprando lá?”

E autonomia financeira, a gente tem?
Então porque muitas vezes temos que esperar horas na fila do banco pra retirar o nosso próprio dinheiro? Então porque o caixa automático tem limite? E quando cai o sistema?

E como fica o direito de ir e vir quando a gente pega um congestionamento?

A religião que escolhemos liberta nossas almas?
Sendo assim, quantas horas de prática religiosa obrigatória precisamos cumprir, pra que nossas almas alcancem este estado de liberdade?

Dizem que:
“Tudo o que é rigorosamente proibido é ligeiramente permitido”
("ligeiramente" é meiguice)
Caso contrário não teríamos os Cds piratas, o jogo do bicho, os dejetos industriais, as madeireiras clandestinas, o massacre cultural de índios, os padres pedófilos, etc...

Seria a Liberdade o direito de passar a mão na bunda do guarda? Seria a Liberdade uma meia verdade?

Ser livre pra errar é um sintoma de liberdade?
Posso errar então, dá licença?

“Liberdade é o direito de transformar-se, de criar, de saber e de debater.”

Ter que provar, diariamente, que a única forma de sermos livres é não termos medo de parecermos ridículos e que o direito ao riso e à alegria jamais poderão ser tirados de nós é muito cansativo. Pra mim virou quase uma obrigação. E assim, deixei de ser livre.